"Aquele tique, muito português, de olharmos para o lado e ver no outro os defeitos que nos recusamos a assumir como nossos, também se observa entre quem produz opinião. É interessante observar com que convicção se digladiamopinion makers classificando-se mutuamente de sectários e como, não raras vezes, ambas as partes têm razão.
Apesar de gozarem de uma liberdade intelectual a que os políticos, presos às suas estratégias, não podem aspirar, estes opinadores evitam os mesmos assuntos e reproduzem os mesmos chavões dos partidos em que se revêem. Lê-los ou ouvi-los é redundante. Parte do cansaço que a política provoca nas pessoas deve-se a estas caixas de ressonância.
No país onde estranhamente temos políticos como
opinion makers e em que muitos jornalistas alternam as suas funções nos jornais com assessorias políticas, a informação política e a opinião são, por tradição, demasiado
engagée, colaborando docilmente com os partidos de maior influência. Ainda há pouco tempo
Cavaco Silva o admitiu em off, para grande desconforto do sector.
Poucas são as vozes verdadeiramente independentes e as que se reconhecem como tal são frequentemente desvalorizadas pela opinião dominante, alinhada e reverente. Até a realidade começar a dar-lhe razão, Medina Carreira era apontado como catastrofista e António Barreto, agora tão citado, era por muitos apontado como um pessimista impenitente.
A crise valoriza agora as suas palavras porque criou uma apetência invulgar por factos. Preocupadas, as pessoas querem perceber o que se passa. É deste interesse renovado dos portugueses pelo seu país que pode sair uma sociedade civil mais informada e mais activa. Mas se os nossos supostos líderes de opinião e directores de jornais não fizerem, também eles, da crise uma oportunidade e continuarem apenas a debitar as verdades convenientes dos partidos que apoiam, não avançaremos muito.
Antes de apontarem o dedinho aos tugas que os lêem e ouvem perorando em tom paternalista sobre produtividade, os nossos "analistas" deviam reflectir sobre a sua. Quantas vezes ousam dizer e escrever mais do que aplausos ao partido do coração e apupos aos seus oponentes? Quantas vezes denunciaram factos que afrontam os interesses dos rapazes de quem são próximos, por amor ao bem comum? Quantos inimigos são capazes de fazer em nome da verdade?"